sexta-feira, 15 de março de 2013

Dinâmica da dívida pública cabo-verdiana



A dívida pública cabo-verdiana decresceu entre 2001 e 2008, passando de 84,1% para 68,2% do PIB. As reformas introduzidas no âmbito do programa PSI (Policy Support Instrument) assinado com o FMI em 2006 (estabelece limite da dívida pública em 70% do PIB para o ano 2009) tiveram grande contributo na diminuição da dívida. Esta redução verificou-se, principalmente, na dívida externa. Nos anos seguintes (2009, 2010 e 2011) a dívida pública volta a aumentar, atingindo 87,5% do PIB em 2011, o que representa crescimento de 28% em relação ao stock de 2008. Este aumento aconteceu, sobretudo, na parcela dívida externa, que cresceu de 46,4% para 67,2% do PIB entre 2008 e 2011. O forte crescimento da dívida externa é justificado pelos projectos de infra-estruturação do país e pela aproximação do fim do prazo de empréstimos concessionais devido a graduação de Cabo Verde ao país de desenvolvimento médio, levou o Governo a aumentar os empréstimos para aproveitar as condições mais favoráveis. Cerca de 82% do stock da dívida externa corresponde a empréstimos concessionais, por tanto, em condições bastantes favoráveis (longo período de amortização cerca de 30 anos e baixa taxas de juro a volta de 1%).

A dinâmica do rácio da dívida pública pelo PIB é analisada através dos impactos do juro e do crescimento do produto na dívida mais a contribuição do rácio do saldo orçamental primário pelo PIB:
 
 Onde:
dt – Dívida pública em função do PIB no ano t
r – Taxa de juro real
y – Taxa de crescimento real do PIB
φ – Saldo orçamental primário em função do PIB

Analisando a dinâmica da dívida pública, pelo comportamento da variável (∆dt), entre 2001 e 2011 há sempre aumento da dívida com excepção do ano 2007. Apesar da taxa de juro real implícita ser sempre inferior à taxa de crescimento real do PIB, o saldo orçamental primário foi sempre negativo (com valores elevados) contribuindo assim para deterioração do stock da dívida pública. No ano 2007 o baixo saldo orçamental primário negativo (-1,9% do PIB) permitiu absorver 2,5 pontos percentuais da dívida pública em função do PIB. 

A superioridade da taxa de crescimento do PIB real em relação à taxa de juro real implícita (devido ao baixo valor das taxas de juro sobre dívida externa), permite que o governo estabilize a dívida pública mesmo tendo saldo orçamental primário negativo (valores da variável SOP estabilizar). O peso dos juros pagos no PIB tem sido sempre inferior a taxa de crescimento do PIB, tornando assim os juros suportáveis.

Quadro 1: Evolução da dívida pública (%PIB)
Variáveis
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
2009
2010
2011
Dívida pública (%PIB)
84,1
87,4
83,0
82,7
84,1
78,4
72,1
68,2
74,4
77,6
87,5
Tx Juro real implícito
1,0
3,8
-1,3
4,1
4,2
-0,1
1,1
-0,8
-2,0
-1,0
-1,9
Tx. PIB real (crescimet.)
3,5
5,5
4,7
5,0
5,6
8,2
6,7
6,1
4,0
5,6
5,1
SOP (%PIB)
-9,4
-7,6
-6,6
-5,8
-9,4
-8,2
-1,9
-5,6
-12
-18
-12
∆dt
7,4
6,1
1,3
5,1
8,2
1,2
-2,5
0,6
7,7
13,2
6,1
SOP estabilizar (%PIB)*
-2,0
-1,4
-5,3
-0,8
-1,2
-7,0
-4,4
-5,0
-4,1
-4,9
-5,4
Juros pagos (%PIB)
1,9
3,0
2,5
2,5
2,2
2,0
1,8
1,6
1,6
1,8
1,7
Fonte: BCV e cálculos do autor; SOP (Saldo Orçamental Primário)
*  Refere ao saldo orçamental primário em função do PIB, necessário para estabilizar a dívida externa em cada ano, considerando o valor da dívida em t-1. 

Com o fim dos empréstimos concessionais, Cabo Verde (em principio a partir de 2015) irá enfrentar taxas de juro dos empréstimos externos maiores e com prazos dos reembolsos menores, o que significa aumento do encargo com as dívidas externas no orçamento do Estado. No Relatório do FMI nº12/29 está previsto, a partir de 2017, taxas de juro efectivo médio anual de 3,7% e taxa de crescimento médio anual do PIB real de 5,5%. E, considerando um cenário com saldo primário nulo (que não é o caso previsto no relatório, onde espera-se um saldo primário negativo de -3% do PIB em 2021 e de -1% do PIB em 2031), a dívida pública atingirá o limite de 60% do PIB apenas em 2034, consoante o cenário básico da Figura 1. Mas, caso o saldo primário for igual ao previsto no relatório, ou seja, uma média anual de -1,9% do PIB no período 2017-2031, para evitar uma situação explosiva da dívida pública em função do PIB, o crescimento médio anual do PIB real terá que ser no mínimo de 6,5%, mantendo a taxa de juro efectivo a volta dos 3,7% ou então, no caso de o ajuste ser a nível da taxa de juro, esta deve ser no máximo 3%, com taxa de crescimento médio anual do PIB real de 5,5%.
Considerando a hipótese do PIB real crescer à uma média de 2 pontos percentuais inferior ao previsto, o rácio da dívida pública em função do PIB assume uma trajectória crescente, transformando num processo explosivo. E, se o PIB real crescer apenas 1 ponto percentual inferior ao previsto, o rácio da dívida pública em função do PIB passa a ter comportamento decrescente, mas muito lento. Figura 1


 
Se a variação acontecer a nível da taxa de juro, com o aumento de 0,7 pontos percentuais, o rácio da dívida pública pelo PIB mantém a comportamento decrescente, conforme a Figura 2.

 



 Assim, para evitar uma situação explosiva da dívida pública, o Governo deve reduzir o défice do saldo orçamental primário ou então aplicar políticas que conduzam ao maior aumento do PIB real, uma vez que o poder de influência sobre as taxas de juro externa aplicada é praticamente nulo.